Por Kieran Mulvaney
Em setembro de 1965, 46 especialistas participaram do Primeiro Encontro Científico sobre o Urso Polar em Fairbanks, no Alasca. O evento pretendia discutir o destino do urso polar diante da crescente ameaça humana. Na época, a ameaça era a caça comercial, que usava aviões para encontrar e empurrar ursos polares na direção de homens armados – um “esporte” que o New York Times descreveu como “tão esportivo quanto metralhar uma vaca”.
A consequência mais significativa deste encontro foi a assinatura doAcordo Internacional para a Conservação dos Ursos Polares e de seu Habitat, em 1973, que marcou o fim da caça comercial. Outra consequência foi o estímulo a uma maior compreensão científica dos ursos polares, já que o encontro de Fairbanks reconheceu que "os conhecimentos científicos sobre o urso polar estão longe de ser suficientes para a criação de políticas de manejo adequadas". Na época, não se sabia se havia uma ou mais populações, nem quantos ursos polares estavam distribuídos pelo Ártico (hoje, calcula-se que existam entre 5 mil e 25 mil).
Quarenta e seis anos depois, a população global do urso polar está estimada entre 20 mil e 25 mil exemplares, e para fins de pesquisa, os cientistas os dividiram em 19 subpopulações. Destas 19, oito parecem estar diminuindo, três estão estáveis, e apenas uma está aumentando. Mais uma vez, a sobrevivência da espécie está em risco, mas a ameaça atual, obviamente, é a mudança climática.
Em vários idiomas europeus, o urso polar é conhecido como “urso do gelo”, pois são de fato criaturas glaciais. Do pescoço comprido à cabeça alongada, das orelhas pequenas à grossa camada de gordura, tudo o que diferencia os ursos polares de seus parentes mais próximos, os ursos-pardos, é uma adaptação à vida entre as banquisas de gelo do Ártico. Mas as temperaturas aumentaram, seu habitat está desaparecendo e as únicas novidades de 2011 não são boas.
Em 2011, a extensão do gelo marinho no Ártico atingiu o segundo menor nível, de acordo com as imagens de satélite, ligeiramente mais alto que o recorde de 2007. No entanto, há quatro anos, uma conjunção de fatores havia causado a redução brusca do gelo marinho, algo que não se repetiu este ano. De fato, o gelo do Ártico custa cada vez mais para se recuperar a cada inverno, os estágios iniciais do que vem sendo chamado de “espiral da morte”.
Isso acontece porque a extensão do gelo marinho conta apenas parte da história; a outra parte, de igual importância, é sua densidade. A perda contínua do gelo mais antigo e espesso impediu a recuperação significativa da área mínima no verão; o gelo do primeiro e do segundo ano compunha 80% da cobertura glacial na Bacia Ártica, comparado aos 55% em média, de 1980 a 2000. Como resultado, o volume total de gelo marinho sofreu uma nova redução pelo segundo ano consecutivo. Além disso, um estudo publicado na revista Nature no final de novembrorevelou que o declínio do gelo marinho foi o maior dos últimos 1.450 anos.
Portanto, era de se esperar que 2011 também trouxesse novas evidências sobre o impacto da redução do gelo sobre os ursos polares. Em julho, um estudo apresentado na Conferência da Associação Internacional do Urso Polar, forneceu "a primeira análise a identificar uma tendência plurianual significativa de ampliação da distância percorrida a nado pelos ursos polares". Os autores do estudo descobriram que 20 ursos diferentes nadaram distâncias superiores a 50 km em 50 ocasiões diferentes. A jornada mais curta foi de 53,7 km, e a mais longa, que durou incríveis 13 dias, foi de 687,1 km. Segundo o co-autor do estudo, Geoff York, do Programa do Ártico do Fundo Mundial para Natureza, os ursos polares estão sendo obrigados a “nadar distâncias mais longas para encontrar alimento e habitat. A mudança climática está puxando o gelo marinho sob os pés dos ursos polares”.
No começo do ano, um ensaio publicado na revista Nature Communications concluiu que o tamanho das ninhadas de ursos polares – e as chances de sucesso reprodutivo – está estreitamente relacionado à quantidade de peso que a fêmea consegue acumular antes de hibernar. Quanto maior a quantidade de gordura, mais energia é armazenada para sustentar a mãe e os filhotes. É claro que, quanto menos tempo a fêmea tiver para comer, menos chances terá de acumular energia. Em partes de seu território, os ursos polares têm tido menos tempo de comer porque o gelo derrete mais cedo no verão e congela mais tarde no outono. Uma dessas áreas fica a oeste da Baía de Hudson, no Canadá, onde os ursos polares estão sendo obrigados a procurar terra firme duas semanas antes do que no começo da década de 1990. Segundo as previsões, isso deve acontecer um mês antes nos próximos 50 anos. Neste cenário, os cientistas calculam que 73% das fêmeas não conseguirão criar seus filhotes, uma previsão que é “outro sinal de que a população da Baía de Hudson provavelmente não será viável sob as condições climáticas previstas”.
Nada disso significa que os ursos polares estão inexoravelmente condenados. A maioria das previsões do desaparecimento do gelo marinho supõe um “oásis” de gelo no noroeste da Islândia e no nordeste do Canadá. Além disso, em dezembro de 2010, o cientista-chefe do Polar Bears International, Steven Amstrup, calculou que o declínio do gelo marinho poderia ser controlado e até revertido se houver redução de emissões dos gases do efeito-estufa.
É uma suposição para lá de otimista. As concentrações de dióxido de carbono na atmosfera hoje excedem as piores projeções do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU, e as emissões de carbono estão batendo recordes: o salto entre 2009 e 2010 certamente é o maior desde a Revolução Industrial.
Afinal, os ursos polares estão condenados? Não necessariamente. Mas a menos que vejamos mudanças drásticas na política, no comportamento e no uso da energia, as chances de ainda restar alguma população daqui a 100 anos parece cada vez mais remota.
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